CORREIO POPULAR / CARLOS CRUZ
20 de out. de 2022
Campinas, quinta-feira, 27 de outubro de 2022
Em prosseguimento, a segunda parte deste Artigo:
O BRASILINVEST cresceu agindo como Banco de fomento, vivendo de montagem de projetos econômicos, mas também gerindo crises motivadas pela economia instável do país, socorrendo um ou outro Grupo que fraquejava diante de dificuldades, tapando buracos, assumindo os custos e tocando os negócios para a frente.
Mário Garnero liderou com extrema habilidade a consolidação do Programa Pró Álcool, até então restrita a experiências e protótipos experimentais. Liderando a articulação entre governo e iniciativa privada, investiu no convencimento da indústria automobilística e dos usineiros, estipulando uma me- ta de pôr no mercado 250.000 (depois ampliados para um milhão) veículos movidos a álcool. Foi uma operação gigantesca que envolveu todos os segmentos governamentais e com aval do Presidente da Re- pública, dos executivos das fá- bricas de veículos e usineiros. Ao final de três anos, noventa por cento dos automóveis que saiam das linhas de montagem consumiriam um combustível mais barato que a gasolina.
Em 1982 a economia mundial estava em um momento dificílimo e o Brasil não era exceção, ao contrário, estava literal- mente “quebrado” a ponto de o Ministro Delfim Neto admitir que nossas reservas cambiais estavam a zero e o Brasil rumava para a reunião do Fundo Monetário Internacional levando sua moratória branca. Intensas articulações, conversas, jantares e intermináveis entendi- mentos com a marcante participação de Mário Garnero, em grande parte fruto de sua credibilidade internacional e relacionamento com os altos escalões de Washington, quase à revelia da chancelaria brasileira mas com o conhecimento e concordância do Presidente Figueiredo, culminou com a visita ao Brasil do Presidente Ronald Reagan, trazendo em sua bagagem um cheque de um bilhão de dólares, adiantando o dinheiro de um empréstimo ponte que estava em negociação com o Fundo Monetário Inter- nacional, suficiente para salvar o Brasil da falência.
Com o país caminhando para a redemocratização, no final do Governo Figueiredo, com novos Governadores eleitos pelo voto direto, as organizações da sociedade civil reivindicavam conquistas que conflitavam com os desejos do sistema, e a igreja exercia papel fundamental, tendo em D. Paulo Evaristo Arns um ator importante e fundamental no diálogo e entendimento com o governo.
Chamado para intermediar junto a Igreja em um conflito envolvendo invasões de propriedades no Araguaia insufla- dos pelos padres, Garnero foi acionado para intermediar entendimentos, e numa articulação com Don Paulo Evaristo Arns, encontrou-se, no Vaticano, com o Papa João Paulo II, tecendo entendimentos baseados na compreensão, solidariedade e bom senso de todas as partes, chegando a bom termo. Todos os anos, a partir de 1970, a Câmara de Comércio Brasil Estados Unidos confere a dois homenageados o título de “Homem do Ano”, um brasileiro e um americano, o mais cobiçado prêmio que um brasileiro pode receber nos Estados Unidos. Em 1984 Mário Garnero recebeu essa homenagem juntamente com John Opel, CEO da IBM, em solenidade concorrida num jantar black-tie no Grand Ballroom do Plaza Hotel de New York, na Quinta Avenida em frente ao Central Park, com a presença de mais de mil convidados.
Nas articulações para a eleição presidencial no Colégio Eleitoral ao final do Governo Figueiredo, Mário Garnero desempenhou, nos bastidores, papel relevante e fundamental atuando discretamente na interlocução com os principais atores, tendo destacada participação nos entendimentos secretos que precederam a transição pacífica do governo e fim da era dos militares no comando. Tancredo Neves utilizou, e muito, da habilidade, confiança e credibilidade que Garnero tinha junto ao Presidente Figueiredo para pavimentar esses entendimentos.
Quando atingido pelas acusações levianas, a liquidação de seu Banco e a perda das torres da Faria Lima, para permanecer nela enquanto se defendia teve de alugar ali uma sala de onde comandou as ações para total recuperação de seus bens, de seu Banco e de suas
torres.
Não entregou os pontos na derrota, posto injusta, trabalhando e se esforçando para reavê-los sem duvidar um dia sequer que conseguiria, afinal estava em jogo seu maior ativo: sua credibilidade, inalterada e inabalada com os acontecimentos, acusações e injustiças contra quem, durante toda vida trabalhou e construiu uma inigualável e insuperável agenda de relacionamento internacional incluindo aí os Presidentes Reagan, Bush (pai e filho), Clinton, Obama, Trump e Biden, que lhe valeu o título simbólico de “embaixador itinerante da concórdia e dos bons negócios”.
A Conferência de Mônaco, narrado no início deste Artigo, foi o ponto alto e triunfal da reafirmação internacional de Mário Garnero. As acusações que pesaram sobre ele e as injustiças sofridas serviram para afastar os amigos de ocasião que se aproximam para tirar proveitos, mas que nas intempéries negam qualquer conhecimento, vínculo ou apreço bem antes do canto do galo.
Atuei ao seu lado juntamente com meu amigo Nelson dos Santos Filho na composição de consórcio para oferecer proposta na privatização da CPFL por fim não concluída, e nas articulações para consolidar o projeto de ampliação do Aeroporto de Viracopos.
Tenho por ele profundo res- peito e admiração pelos expostos motivos além de seu cavalheirismo, habilidade, competência e seu espírito inquieto que o motiva, impulsiona e o leva adiante sempre em busca de novos desafios, projetos e realizações.
Celebro o Dr. Mário Garnero como um grande brasileiro e merecedor de nosso respeito e admiração, e numa consideração final sobre o episódio político que o feriu, relembro o ensinamento que lhe foi transmiti- do por Juscelino Kubitschek: “não há poder que resista à força moral”; a sua força moral.
Fonte: Jornal Correio Popular de Campinas